9.8.17

Império



Tobias Jesso Jr., “Without You” (live at Later with Jools Holland), in https://www.youtube.com/watch?v=ScQW5mizYGo    
O património abainhado no ouro mais precioso que temos: os lugares demandados, as palavras de que apenas nós fomos tutores, a casa fortaleza, a janela por onde lançamos âncora ao resto do mundo – o resto do mundo que cabe todo na moldura da janela de que somos feitores.
Há, neste império, todo o mar que temos nas mãos, o mar por onde sondamos as purezas e as impurezas, a glorificação do que tal merece e os ruídos da melancolia, toda uma maresia imorredoira que é o perfume que exalamos. As flores que tingimos são o vibrante testemunho da inteireza. Não sabemos se não ser nós, o império onde o mundo tem lugar. Não há equívoco: é assim mesmo, do todo (o império que somos nós) para a parte (o mundo, de que somos casa). Desalinhando dos néones apetecíveis, preferindo as sombras de onde erguemos as ameias que queremos singulares, logo seguidas por beijos irrecusáveis, as horas de silêncio mais eloquentes do que palavras mil, um singelo olhar que entra nas profundezas da alma, a música lida, a poesia cantada, as palavras-sedimento que cimentam as costuras de um uníssono. Pois não há sombras, daquelas madraças, improfícuas, as sombras lugares-tenentes da perfídia, que sejam apoquentação bastante. (Deixamos essas sombras aos seus fautores, pobres algozes de si mesmos, medíocres representações da espécie.)
No lugar mais alto do tempo, onde descobrimos os promontórios inacessíveis (menos para nós) de onde tomamos o mundo nas mãos, encontramos a matéria-prima do império de que registámos marca. Na indelével dança, imaginada ao menos (por incapacidade minha), onde abraçamos os corpos na confluência dos rios que fertilizam os lugares que pisamos. Não deixamos os corpos órfãos, nem desaproveitamos as palavras que pedem licença ao silêncio capaz. No domínio que é nosso império, somos predicados perfeitos, representações autónomas das vontades alheias, somos uma vontade soberana, desenhando no céu à nossa volta as palavras caiadas no fogo nunca fátuo.
Somos o palco onde têm perfeição as veleidades até mais distantes. Desde o império, no lugar incontestável de imperadores, sobranceiros ao mundo que se depõe aos nossos pés.

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