13.12.16

Nunca somos velhos

Os Velhos, “Manso”, in https://www.youtube.com/watch?v=kGqXBEGbDiM
Não pretendo arrematar lugares-comuns para verberar o óbvio. Não quero trazer a palco a indigência do pensamento feito sobre coisas repisadas por pensadores distintos. Só quero dizer que não seremos velhos mercê da resistência que trazemos nas veias inundadas de seiva ímpar.
Porventura nada poderemos contra as catedrais do tempo que mandam erigir as rugas e os corpos gastos, que aplicam doses graciosas de desmemória e que desaprovam a inteireza das qualidades intelectuais. Mas isso não interessa. Enquanto formos tutores da nossa idade, não capitularemos diante dos relógios que enfraquecem a imensa mãe-de-água que é a vida que trazemos no bornal. Enquanto quisermos desautorizar a mediação do tempo banal e soubermos ser os arquitetos do tempo que importa. Para juntarmos nas mãos unidas a terra fértil que roubamos a um chão aleatório, enquanto os olhos viajam por paisagens que se sucedem numa tela clara que desbrava as fronteiras dos olhos. Pois – e repito-me propositadamente – nunca somos velhos.
Seremos o desmentido da velhice, mesmo que os outros em nós vejam os rudimentos daquilo que reputam como envelhecimento. Isso acontece a todo o tempo: uma rapariga de quinze anos considera velho um homem de trinta e cinco, e este admite que uma mulher de cinquenta e cinco se precipita a caminho da velhice. Envelhecer é uma medida subjetiva. Varia consoante as pessoas que se põem a jeito da velhice. E depende do ângulo etário através do qual outras pessoas são sopesadas na escala do envelhecimento. Outra vez: nada disso interessa. Nós é que objetivamos a velhice que deixamos vir ao nosso regaço. Decidimos se deixamos o corpo arqueado perante o junco do envelhecimento. O cansaço do tempo, o corpo marcado pela velhice e o pensamento em decadência podem tributar a irremediável marcha para o tempo que se esgota.
Justamente: seremos (quando lá chegarmos) tutores únicos do tempo que aterra em nossas mãos. Pois a resignação abre os filamentos da muralha por onde entram os pavorosos lugares-tenentes da desídia, algozes à espreita para colher nos corpos cansados dos desistentes as flores que hão de habitar túmulos sem serventia. Por isso, não seremos velhos. Seremos domadores das virtudes todas que são o adiamento desse tempo que há de ter tempo para ser indeclinável.
Até lá, e no muito adiantado estado de um tempo que assim se persevera, não seremos velhos.

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