9.3.16

Aniversário

Einstürzende Neubauten, “Youme & Meyou”, in https://www.youtube.com/watch?v=tNYe3ExyKJ8
O aniversário é o natal de cada um. Recebe-se atenção, e algum carinho (se for o caso), dos mais próximos, dos entes queridos e dos que se lembrarem do aniversário. É como se o aniversariante fosse o centro do mundo por um dia. Pelo menos, do mundo que dele tem conhecimento – que o resto do mundo, o muito maior mundo que extravasa os seus limites, nem dá fé do aniversário.
Um aniversário depende do estado de espírito. Depende da fase da vida. Depende do sentimento imberbe, quando os aniversários ainda são poucos no viveiro das memórias e coalesce um certo pesar por a idade adulta tardar. Ou então, o aniversário é a matriz da nostalgia: em pano de fundo surge a passadeira duradoura por onde se tem demorado a existência e parece que o envelhecimento não tem freios. O aniversário podia ser um daqueles marcos simbólicos fixados no calendário que ajuramentam resoluções contundentes. Mas não é. O aniversário é só um dia que vem depois de outro, sua véspera, e véspera do que virá imediatamente a seguir.
À medida que os aniversários ganham bolor, os mais desconfiados, os que acordam e não percebem que a alvorada é uma dádiva, consomem-se em melancolia. O pavio da vida – protestam com anjos interiores pouco protetores – vai ficando rarefeito a cada aniversário ultrapassado. Estão enganados. Um aniversário é sempre uma prenda que a vida obsequeia. A maior de todas. Esquecem-se que outros houve que não conseguiram festejar o aniversário que tem esse número. O dia do aniversário tem de ser despojado da sua pompa. Dá-se o caso de ser o dia em que a vida se iniciou. É só isso.
Que os mais próximos, os entes queridos e outra gente conhecida tenham a cortesia de lembrar que é mais um aniversário que dobra o Rubicão, é sinal que somos credores de alguma simpatia, de algum amor. No dia do aniversário temos uma leve desconfiança que somos o centro do mundo – mas só do mundo que travou conhecimento com a nossa pessoa. Não é credencial que meta respeito, devido ao devaneio narcisista que quer irromper. De resto, um aniversário não é sinal de envelhecimento. É sinal de prolongamento da existência. 
Os aniversários só fazem sentido quando o aniversariante celebra o amor e o carinho de quem se lembrou do aniversário.

Sem comentários: