15.1.16

No olho do furacão

Sharon Van Etten, “Afraid of Nothing”, in https://www.youtube.com/watch?v=AI_qsRPSMKs
O palco medonho. Ventos que ciciam uma fúria indomável sussurram as prováveis arrelias de Éolo. Despeja-se no chão uma chuva diluviana, atira-se contra o chão vinda de todos os lados. Pelas imagens do satélite, o centro da tempestade aterrou neste lugar. Estamos no olho do furacão. E, todavia, parece que não. De repente, a calma dos elementos. O vento extinguiu-se. A chuva já não cai porque o céu foi tomado por uma súbita claridade que evaporou as nuvens.
Não te iludas: isto não é a bonança que arremata os despojos da tempestade; é uma intermitência do furacão, que promete descarregar a sua ira sobre este lugar, outra vez. Não lhe terá chegado o castigo de há umas horas. O lugar que foi altar sacrificial aos caprichos de Éolo ainda não pode desatar o nó da desordem. As imagens do satélite dizem tudo: o olho do furacão é apenas uma trégua que serve para a borrasca reinventar a sua fúria. À volta do olho do furacão rodam vertiginosamente as nuvens e a chuva, tempestuosas. O olho do furacão é uma breve ilha sitiada por tempestade por todos os lados. Só falta saber por onde vai entrar a segunda dose da tempestade.
Nós, no olho do furacão, não deixamos o temor tomar conta dos sentidos. Agarramos as mãos à noite medonha, pois o furacão, soez, ataca pela noite para transfigurar tudo em redor com a ajuda da penumbra. A boca seca ajuda a tingir os sobressaltos. Não queremos saber dos lamentos da tempestade nem das suas estrofes iracundas; a coragem vem de dentro, como se as veias ferventes derretessem os medos assimilados. Estamos preparados para que o olho do furacão se mova para outro lugar e entreabra a janela para o desarranjo tempestuoso que Éolo congeminou.
Não deixemos as nossas empreitadas para outros. O peito põe-se duro para ser um cais firme que esbulha os trabalhos insidiosos de Éolo. Sairemos do olho do furacão com mais força do que dantes.

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