29.6.15

Men in black

Spoon, “They Want My Soul”, in https://www.youtube.com/watch?v=gPlJ0ecD9Ew
(Depois de ler Yanis Varoufakis, “O Minotauro global: os Estados Unidos, a Europa e o futuro da economia global”, Lisboa, Bertrand Editores, 2015)
Parece uma narrativa de conspiração. Ou a necessidade de exorcizar os fantasmas que atormentam uma ideologia. É mesmo assim: tão categóricos que falam em nome da verdade, como quem se acha o seu tutor e não admite que outros, os que pensam diferente (o que, já de si, é heresia), duvidem da verdade assim dita e se revejam noutra. Curiosamente, vêm de sítios onde (quando convém) se teoriza o relativismo. Que, deviam lembrar-se nestas alturas em que os imperativos categóricos (que são convenientes) assomam, aceita as cores variáveis da verdade, ou até admite que a verdade é um sofisma.
Estes são tempos difíceis. A crise morde na carne. Critica-se a indolência dos mandantes, que devolveram – e em dose reforçada – o poder aos homens de negro que sinistramente dominam a finança e, pela finança, dominam tudo. A começar nos mandantes, reduzidos a simples lacaios. Os homens que vestem sempre de negro, na finança como nas organizações internacionais que traçam a régua e esquadro políticas de salvação que deixam as terras salvas entregues ao cadafalso da penúria. Estas medidas parecem feitas à medida dos homens que vestem de negro: desapiedadas, como se aos seus fautores não fosse reconhecida a existência de coração, humanos desumanizados.
A parte de uma conspiração global: para os mais ricos, os que exercem influência e distribuem recompensas que seduzem, engrossarem a abastança. E os mais pobres reduzidos a mais pobreza, a mais dependência, num acantonamento de miséria (material e moral) que tem de ser denunciada. E tudo isto é intencional. Os abastados, inebriados pela ganância e pelos frutos materiais da riqueza, estão a condenar os desvalidos à miséria. Talvez sejam ignorantes; talvez estejam apenas embriagados pela ganância; talvez vivam numa torre de marfim, de onde não avistam a miséria que apoquenta os pobres. Os homens vestidos de negro, com prebendas generosamente distribuídas pelos poderosos da finança, são diligentes no cumprimento da vontade destes. Uns e outros desconhecem o potencial de sublevação dos desvalidos. Não conhecem a história. E como ela (juntamente com a irreprimível ganância) lhes pode ser fatal.
Nesta narrativa apocalíptica, não entendo duas coisas. Primeiro, o excesso de pessimismo antropológico de quem o não era (os críticos deste estado de coisas), que parecem, em volte face oportunista, terem sido convertidos àquele pessimismo. Segundo, a perene desconfiança dos intérpretes da finança e dos seus putativos lacaios (os mandantes). A menos que também creiam na genética ignorância da casta, a teoria da conspiração não faz sentido. Seria como os da alta finança, de braço dado com os lacaios que comandam, servirem a cabeça na guilhotina do povo reduzido à miséria e sedento de libertação deste jugo.
Não bate certo. O que leva as possíveis explicações para outro lado. Uma argumentação que tem o esteio do pretexto, em vez do argumento. Sitiados pelo ideologia.

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