30.10.14

Pois se até os homens choram


Samuel Uria e Manuel Cruz, "Lenço Enxuto", in https://www.youtube.com/watch?v=GYBSMMURsVE
Desenganem-se os vetustos marialvas: os homens também sabem adestrar as lágrimas. Não são menos homens porque vertem lágrimas quando lhes é dado ficarem em frangalhos. Ou quando a emoção sobe aos olhos marejados. Choram, os homens. Como choram as mulheres. O que não conta, em desabono dos valentes marialvas, é aquartelar as pessoas entre os que choramingam e os que se mantêm firmes no seu posto, imunes às lágrimas salgadas, e que os primeiros são frágeis criaturas consumidas num mar de lágrimas e os segundos são heróis que servem de abrigo aos miseráveis.
Choram os homens. Sensíveis ou não. Uns podem mentir, em achando que as lágrimas são fermento da vergonha. Choram em privado. Escondem as lágrimas do conhecimento. Não querem que venham juízos perfecionistas sobre a frouxa têmpera dos que, mandam dizer os marialvas, se entregam à fragilidade das lágrimas. Mas é tudo o seu contrário. Se interesse houvesse em recrutar os fortes de têmpera (que não vem ao caso inventariar), esses eram os que mostram as lágrimas quando elas são vertidas com sentido.
Os que as escondem, cavalgando uma bravura espartana que é um sortido datado, são hipócritas dos sentidos. Pois eles também choram. Não têm o lenço enxuto. Também lhes é devido respeitoso elogio: eles, humanos como os demais, têm canais lacrimais que não foram acometidos por uma aridez sahariana. Choram, como os outros de que eles desdenham por dizerem, em jeito de defeito de personalidade, que choram. E se decidem resguardar as lágrimas para o pudor da intimidade, é direito que não lhes pode ser retirado. Mas não venham dizer que os que têm a coragem de mostrar lágrimas são gente encolhida pela fruste macieza das emoções. Elas existem, pois somos todos gente que voga num extenso mar de emoções. Algumas rimam com as lágrimas que são vertidas na levitação do sal que vem da ebulição dos motins interiores.
Choramos – e depois? Arranjamos coragem para limpar as lágrimas. Sem as recusar.

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