14.7.14

Rapsódia serviços secretos

In http://cmarinsdasilva.com.br/wp/wp-content/uploads/2011/08/espiao-veja.jpg
(Mote: a Alemanha expulsou agente secreto que andou a contra-espiar o que não devia a pedido dos Estados Unidos – ou: como é feio saber das coisas íntimas dos amigos à revelia deles)
Jogo duplo. Espiões que fazem o trabalho sujo para os dois lados é um romance que pensávamos ter terminado com o fim da guerra fria. Parece não ser o caso. Agora até os amigos se espiam mutuamente. Não vou ao fundo da questão para tentar entender o que leva um aliado a querer saber os assuntos que outro aliado decide classificar como secretos. Talvez seja o mote para antropólogos ou sociólogos, para concluírem acerca da propensão de muitos para saberem da vida dos outros através de revistas cor-de-rosa (por exemplo).
Todavia, o submundo dos serviços secretos não quadra com as coisas mundanas que passeiam nas páginas da imprensa especializada em ditos e cochichos. É a ralé da política mundial, pois não deixa de ser feio gastar rios de dinheiro com espiões e parafernália tecnológica de apoio às atividades de espionagem. Quando entramos no espiolhar do que fazem os países amigos, saímos dos limites da compreensão para o fenómeno. Admito que a tolerância para a existência de serviços secretos é mínima, de nada valendo a argumentação tosca dos seus defensores (dizem que saber segredos dos outros evita males maiores; e assinam o pretexto de que sempre foi assim e não é agora que vai mudar).
O palco montado para a função: o espião alemão desdobra-se na sua dupla identidade. Espia para a Alemanha e contra-espia para os Estados Unidos (ou será ao contrário?). Os alemães saberiam do jogo duplo? Aguentaram até quando deu jeito denunciar a situação? Deixaram o contraespião ter acesso a informação falsa, para enganar quem pagou a contraespionagem? E os americanos, estariam confortáveis na posição imunda de quem paga a um subordinado de outros para trair a confiança de quem lhe paga o salário matricial? Podiam os americanos ficar sossegados, pois quem espia e contra-espia pode a certa altura virar o tabuleiro do avesso e contra-espiar contra quem já estava a contra-espiar?
A espionagem presta-se a estes equívocos. Está refém de comportamentos ambíguos. É o lugar onde a confiança é palavra vã. A ganância dos homens trata do resto. Os proveitos desmultiplicam-se quando os espiões passam a jogar dos lados do tabuleiro. E os aliados, que segredos dos seus aliados querem estroncar? São aliados quando assim se comportam?
Não vinha mal ao mundo se os serviços secretos fossem extintos. Ingénua proclamação – estou ao corrente do juízo. Há, contudo, ingenuidades que são mais crescidas do que os adultos preceitos que nos regem.

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