7.5.14

A possibilidade do impossível

Micah P. Hinson, "The Possibilities", in https://www.youtube.com/watch?v=HRRnosHzdCw
O que somos, se não a têmpera de quem se não amedronta diante dos sobressaltos? O que somos, se não os pergaminhos da ambição, pois sem decantarmos os desafios ficamos reféns de um torpor incendiário?
Os cânones ensinam o possível. Não se fala do impossível. Deixa-se o impossível aos sonhadores, aos lunáticos, aos poetas que parecem viver num mundo hermético, aos vendedores de alucinações. Não – diz-se com redobrada ênfase – o impossível não pertence ao leque das possibilidades, deve ser banido do léxico das empreitadas. Ou corremos o risco de fazer par com a fileira de desprendidos que se alimentam do vazio – essa gente não recomendável. E não queremos, pois não, ó sacerdotes da normalidade? Não vão os azimutes oníricos despertar assombrações que se acreditavam hibernadas e que, ao verem outra alvorada, podem tudo inquietar com seu malsão feitio. A rotina não se compraz com espíritos livres, com a rebeldia de quem desafia a impossibilidade, pois não, ó sacerdotes da normalidade?
Todavia, somos matéria empenhada aos sonhos. Por mais que os tutores da possibilidade nos guiem pelo tamanho escasso por nos deixam mover, somos fautores dos sonhos que nos comandam, dos sonhos de que somos arquitetos maiores. E enquanto os sonhos se encastelarem, diremos não à ditadura da possibilidade que encerra o terreno das impossibilidades numa masmorra escura. Pudera: os tutores da normalidade, tementes do desarranjo do simples arremessar da impossibilidade, são próceres dos limites por eles entronizados como matéria aceitável. Vigilantes absolutos, implacáveis para quem ousar a dissidência.
Enquanto houver sonhos por compor; enquanto houver livre arbítrio que não empalidece diante da tirania dos próceres das possibilidades; enquanto formos gente de matéria viva e curadores do pensamento livre; enquanto não nos deixarmos empenhar pela intransigência da resignação: seremos engenheiros das impossibilidades que nos apetecer, nem que elas transitem no limiar da transgressão. As proezas são tradução de impossibilidades que o foram em devido tempo, mas que a destreza dos afoitos devolveu a diferente território, agora o da possibilidade.
E manteremos a centelha viva, a que nos acende o vasto mar das impossibilidades. Que só o são até que nos metemos ao caminho para que o deixem de ser. Pois do nosso engenho tudo depende.

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