2.4.14

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Era uma aventura ser quem era. Uma aventura que doía. Não conseguia caber dentro do eu que era. Não que esse eu fosse maior do que a estatura que tinha; só que estava desavindo com o corpo que herdara dos caprichos da natureza, angustiado por saber que aquele eu o contristava.
Condoía-se ainda mais quando o deslumbramento era a combustão que confundia o sonho com o tempo acordado. Eram as revistas que retratavam as façanhas do escol social, era a ambição da abastança que não configurava bons modos na deteção dos meios próprios para os fins, ele era a avareza dos sentimentos, ou um egoísmo indeclinável. Mas o tempo fazia o seu curso e as promessas de diferença (da diferença para melhor) continuavam em procrastinação.
As manhãs eram custosas. O tempo diurno custava a passar. As dores da sua consumição não se desagravavam. Não conseguiu ganhar madurez. Nem com as tantas vicissitudes por que foi transitando. Nem com a dura realidade em que esbarrava, a realidade faiscando luzes de néon diferentes das que queria que fossem sua cobertura feérica: esses néon tinham uma tenção de advertência, como se fossem um chamamento à terra. Para piorar, convenceu-se que era personagem paralela à da sua existência. Uma personagem na ribalta. Talvez para ocultar a vidinha desinteressante. Foi quando começou a viver aprisionado a um tremendo sonho. Um sonho, afinal, terrível, porque escorregou para a auto negação. Passeava nas ruas donairoso, convencido que era pública figura. Convencido que as outras pessoas se cruzavam com ele dizendo para seus botões “olha, ali vai ele”. Mas era caução da mesma indiferença a que são votadas as anónimas personagens.
Nunca desistiu. Passou a maior parte do tempo que foi seu mergulhado na alucinação. Firme na certeza de ser um émulo do que sempre apetecera ser. Não foi de estranhar que vivesse abraçado a uma dolorosa solidão. E que terminasse os seus dias imerso na mesma terrível solidão. Ao menos, suspirou em seus derradeiros instantes, ninguém teria o enfado de testemunhar a sua agonia.

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