28.11.13

Ter medo de ter medo do escuro

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É a maior coragem. A maior lucidez. Quando à frente dos pés está uma baça cortina de um tecido espesso que não deixa ver o que se encontra do outro lado. E quando a saciedade do conhecimento destrava o apetite pelo saber (sobretudo quando o saber é saber fazer interrogações), por simples desconfiança que do novo desponta o amanhã em sua diferença. A cortina baça é o sicário que encomenda a sede de conhecimento às trevas de um deserto qualquer.
Podem alguns, com a coragem dos forcados que vão à cara do touro, proclamar que de nada têm medo. E que seriam diligentes se afocinhassem nos corredores ensombrecidos pela penumbra que só deixa à mostra uns vultos disformes. Podem puxar o lustro à coragem néscia, que através dos corredores ensombrecidos apenas vêm o nada que é fermento das trevas. Talvez não se importem de vegetar na agnosia. Talvez lhes seja mais excitante a exibição de glória de quem entrou no escuro labirinto e dele saiu incólume. São os que recusam atravessar pontes, pois firmam os pés no lado que julgam ser sua pertença e desprezam o outro lado que se descobre quando o corpo arremete pela ponte. Coragem desta laia é lacaia da indigência.
Os mandantes, sobretudo os que cavalgam no trémulo estado de insegurança própria, não se inquietam com a escuridão. Porventura gostariam de demorados eclipses. Ao menos a turba seria sossegada, pois na escuridão prefere descansar o corpo no labéu do sono. Ter medo do escuro é lúcido. É quando a voz de protesto, ainda que silenciada no íntimo do ser, é o maior desafio aos próceres do pensamento de perna curta. Ter medo de ter medo da escuridão medonha não é reflexo condicionado. É quando se embolsa a maior das coragens, não da coragem espúria dos valentes que só conhecem a razão da força e nem dão conta de como a sua putativa grandeza é a mais mesquinha miudeza.
A noite tem outras serventias. Pois os olhos vendados pelo sono não partem – não podem partir – em demanda do conhecimento.

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