30.10.13

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Julgava-se ilusionista do tempo. Seu tutor, como se todas as clepsidras estivessem metidas em suas mãos. Queria arrematar o tempo em sua celeridade, porque não cuidava de apascentar a paciência que é diligente. Não era o tempo que passava por ele; gabava-se de ser ele a passar pelo tempo, com a destreza de quem se encanta com os holofotes luminescentes que, de tanto o serem, são a hermenêutica dos sujeitos desligados do predicado.
Na imberbe condição de uma juventude que se alvitra capaz de amadurecidas proezas, bebia do cálice das certezas. A maior de todas: era intangível ao tempo tiranete. Dono de uma imortalidade que vivia por dentro da insuprível mortalidade humana. Ou, por outras palavras: quando viesse o epílogo e a mortalidade irremediável fosse confirmada, já nada importava se tudo o que convocara a atenção fora tragado com voracidade, como se o amanhã não fosse tempero da existência. Tudo o que haveria de ser feito enquanto os olhos estivessem acordados era a medida da imortalidade.
A heráldica do tempo cuidava da intemporalidade. Por isso houve noites em branco, alvoradas adiadas, sono embotado mercê do afogueado estado da alma que queria cativar entre as mãos a mais pura essência do ser e do estar. Foi quando aprendeu que o tempo não é uma medida que se unge pela quantidade. Na sua intersubjetividade, alberga diferentes medidas. Afere-se pela qualidade com que é sentido na pele. Por isso resguardava junto ao regaço as clepsidras que açambarcava quando as janelas se entreabriam às viagens imaginadas. Era, convém lembrar, tutor dessas clepsidras. Que pautavam o andamento das horas e dos minutos consoante a sua vontade.
Quando, enfim, percebeu que o tempo é malsão e deitou fora as clepsidras erráticas, entrou no Ramadão dos desenganados. Custou o convencimento de que afinal é o tempo que passa por ele. Custou saber que está encomendado ao envelhecimento. De começo, jurava que o envelhecimento seria retrógrado. Com a bênção dos calendários sobrepostos, em cima da poeira adicionada pelo tempo irremissível, houve um tempo em que capitulou perante o tempo. Que deixou de ser malsão. Deixou, até, de ser o opróbrio de rugas que desatou catilinárias ao tempo amaldiçoado.
Hoje não é nada disto. Vê o tempo que se desbota com a placidez do nevoeiro que entra, vagaroso, na barra do rio e perfuma as margens com maresia.

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