13.8.13

Aluvião


In http://comoviaja.com.br/wp-content/uploads/2012/04/portc3a3o-de-embarque-aeroporto-santos-dumont-rio-de-janeiro-foto-nathalia-molina.jpg?w=300
Uma terra qualquer, longe daqui. Onde apenas vivem desconhecidos. O idioma lúgubre, como a paisagem se parece aos olhos mal com ela entram em contacto. A partida fora necessária. À míngua de oportunidades, emalados os pertences e as pernas rumaram à aventura que sempre é o desconhecido. Seria poda de sociólogos estudar este paradoxo: como voltamos a ser gesta de emigrantes em contramão com as levas de migrantes que do estrangeiro nos procuram demandando oportunidades.

Os mais novos despedem-se da família e dos amigos, dos consortes se os houver. Já não é emigração clandestina, como dantes, quando as fronteiras eram obstáculo e eram passadas a salto. Ou, quando a emigração não era clandestina, e os nómadas de então se faziam à vida diferente a partir de uma gare ferroviária. Os novos emigrantes, que ainda deambulam por uma juventude que seria desperdiçada se teimassem no sedentarismo e vegetassem no desemprego, partem de avião. Despedem-se dos entes queridos nos aeroportos, que são a aviltada imagem da injustiça de que se sentem vítimas. O aeroporto é a porta de saída de uma terra que não os quis compreender.

Mas eles partem na incógnita das oportunidades que os possam esperar, para lugares onde elas fruem do nada. Se deixam para trás uma terra que não os quis, por que hão de partir imersos em prantos (a não ser pela solidão prometida e pela ausência dos entes queridos)? Para onde vão, há de ser terra fértil. Não se escondem do marasmo de uma terra carcomida, locupletada pelos mais velhos que não se desapegam do intransigente egoísmo. À falta de sindicatos que defendam os mais desprotegidos – que concluem estudos e esbarram no quixotesco desemprego – esta gesta, que parece ter sido mal parida por uma mátria que acham ser sua, entrega-se a um exílio voluntário.

Que enxuguem seus prantos, contudo. Deixam uma terra madrasta. Para onde vão não pode ser pior. Nas léguas de distância que os separam da terra madrasta, a nova terra que se fizer sua casa será aluvião. É quando se estima que de grandes males irrompem luzidias janelas que se entreabrem. Ao longe. Ao longe. Num aluvião qualquer.

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