10.6.13

Portugal dos pequeninos


In http://coimbrainnovation.dei.uc.pt/wp-content/uploads/2010/12/DSC_0398.jpg
(Discurso na impossibilidade de ser convidado a proferi-lo por ocasião do dia de Portugal, Camões e das Comunidades)
Quando o Estado Novo mandou construir em Coimbra o Portugal dos pequeninos, o futuro estava a ser escrito antes do tempo. Décadas depois, perdido o império colonial e achado um lugar pequenino na Europa, situamo-nos nos contrafortes do que, historicamente, sempre fomos: reduzidos à pequenez territorial e à periferia geográfica, a exiguidade a quadrar com a insignificância no teatro das nações.
Podem os mais otimistas e os que se orgulham do lugar que as gestas anteriores deixaram para a história contrapor que a história não deve ser aviltada e que o tempo presente não merece o apoucamento da pátria. Temos um mar imenso, temos uma comunidade de falantes que faz da língua uma pátria comum, uma das mais faladas por todo o lado. Somos ainda uma grandeza, todavia turvada pelo torpor que tomou conta de uma sociedade apóstata no freio da descrença intemporal nos que a governam. Diria que o mar imenso que reclamamos ser nosso, com os recursos ainda incomensuráveis que pode oferecer, e a língua que se diz cimentar uma comunidade de falantes, são meros símbolos que mitigam uma grandeza só inscrita na matriz da história. Mas que é só isso. Uma nostalgia bastarda que alimenta uma esperança no passado, quando a esperança devia estar inscrita no tempo futuro – ou reduzir-se à névoa do presente, do dia que passa de cada vez sem a ousadia de cerzir planos para os amanhãs incertos.
A história não deve ser panaceia. O Portugal dos pequeninos de Salazar encerra outra carga simbólica. A história de proezas foi um acidente no mais longo recorte da história. Evocar as descobertas, os intrépidos navegadores, os ousados colonizadores, as riquezas vindas dos lugares açambarcados, a oferta de novos mundos ao mundo, tudo apenas um apenas um episódio, e pequeno, da história que não começou em 1143. Começámos por ser pequeninos. Fizemo-nos a pulso, repelindo invasões e fazendo-nos mais tarde invasores. A concorrência das outras nações, mais poderosas em armas e exércitos, e a modernização do tempo que embaciou os impérios coloniais, deixaram-nos com aquilo que fomos antes da pretensão da grandeza mundial. Esta foi acidental. Uma exceção na vontade intemporal.
Quando agora aportamos ao refrigério das efemérides é um presente e um futuro que se hipotecam nas brumas da memória. Não digo que seja esquecido o passado. Mas que ele seja a medida certa para evitar o viés da história que, contada com a muita distância do tempo, só serve para adiar o presente. De cada vez que vamos às brumas da memória evocar as proezas dos antepassados, maiores são as dores dos dias presentes, maiores as incógnitas imersas no futuro já de si tão incerto. Esse é o maior sinal de uma pequenez condoída. Da pequenez que, quando mal digerida, fermenta amargura. Quando a pequenez devia ser admitida sem vergonha do presente, porque pequenos sempre fomos.

Sem comentários: