26.4.13

A não morte


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(Depois de “Rozencrantz e Guildenstern”, de Tom Stoppard)
Não. Não é possível que eu morra. Não estarei cá para ir ao meu próprio funeral.
E a morte, interessa? Parafraseia-se Shakespeare: a morte é uma arrelia por causa da eternidade. Os religiosos, os que acreditam num deus qualquer, os que adormecem serenos ao saberem que no derradeiro encerrar de olhos têm a eternidade abonada, olham de frente para a morte. E se a eternidade for um longo bocejo, nós despidos do corpo, agarrados a uma promessa de imaterialidade que não podemos experimentar na vida que sabemos ser?
Uma ideia entranha-se em seu desassossego: o nosso funeral é o único a que não podemos ir. E o que dirão de ti no dia do funeral em que tu, já féretro e encerrado no caixão, não tens os sentidos em ebulição? Dirão, como é de bom tom recordar quando um mortal assume a sua mortal condição, que teve uma existência exemplar, o cortejo de predicados invejáveis, com gente a desfazer-se em lágrimas pela perda que a tua partida representa para a humanidade. Aos mais narcísicos é que custará saber que não podem ser testemunhas do sua cerimónia fúnebre. Seria um dia triunfal, só que o narciso terá partido com a definitividade do último sopro.
A morte é um não assunto. Incómoda, mete a foice fria na carne que adormece, já decadente. Mas a morte é o lugar prometido onde se extingue a perenidade. A existência é efémera só o é para os que não se incomodam com a eternidade prometida para depois da existência. E a eternidade deve ser uma maçada sem comparação. A morte, quando vier, virá em seu devido tempo. Dizem os costumes que os que abalam novos ainda são credores de vida que lhes foi subtraída a destempo. E de que serve o apontamento de injustiça? A morte, quando vier, vem em seu devido tempo. Do resto tratam os caprichos da grande roda da vida que, entre em lotarias intermináveis, seleciona os escolhidos.
E que dirias do que dirão os que estiverem em prantos interiores diante do teu corpo finado? Que exageram nos panegíricos.

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