5.9.12

Os rapazes


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Que estroinice. Eram os dias das alegorias madraças, os pés pousados no fértil terreno da irresponsabilidade. Havia uma palavra que gostavam de ouvir, mas só os eruditos açambarcados pela sua indecência a proferiam: topete. Eram dados ao topete. À provocação gratuita. Tinham passatempos preferidos. Partir ovos do alto da ponte, a gema e a clara estatelando-se nos ombros de quem passava (de preferência homens de negócios apessoados). Ir à festa do Avante com pins de Trotsky e a bandeira chinesa a tiracolo da mochila Carolina Herrera. No jogo da “seleção de todos nós”, a meio do hino entoado com o brio patriótico despirem os casacos que deixavam à mostra camisolas da equipa adversária. Estagiar na estação de Santa Apolónia, bem no fundo do cais, quando os comboios ainda vão em marcha lenta no arranque para a viagem longa e os passageiros espreitam em despedida dos entes queridos, para darem uns tabefes nos pategos à janela. Depois de uma noite de diversão, e depois de espalharem a confusão provocando pancadaria à far west, amesendarem numa confeitaria seleta misturando-se com o povo que trabalha e com as coquetes debicando tarte de limão, pedindo mais uma mão cheia de cervejas destravando a vozearia. Iam juntos a casamentos frequentados pela nata dos aspirantes a socialite e, na hora de desbloquear conversa com os pimpões desconhecidos com que partilhavam mesa, descreverem com detalhe uma noite de labuta na recolha do lixo, causando esgares de nojo nas dondocas em ostentação de linhagens. Um dia foram à ópera e deixaram os telemóveis ligados, propositadamente ligados em som estridente, para serem contactados ao mesmo tempo e a audiência se irar com o toque que misturava grupos de rock industrial. Eram os dias estarolas. Queriam que as mãos estendidas resgatassem a demência saudável da adolescência. Mesmo que fosse fora do tempo, que eram rapazes tardios nos trinta e muitos, quarenta e poucos. Não queriam que se soubesse que até eram pais de família.

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