14.2.12

“A Europa é nossa” (parte III)


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Depois de uma noite mal dormida, os que pensavam ser os mandachuvas do país intervencionado saborearam um pequeno-almoço requentado e a privação da liberdade. Não estavam autorizados a sair da cela. Era ainda manhã cedo, um general mal encarado avisara que a junta revolucionaria ainda não decidira o que fazer com eles. De uma decisão estavam certos, e tinha sido tomada: estes presos especiais só tinham uma regalia: uma televisão sintonizada no canal de notícias internacional, para perceberem o que haveria de ser dito pelo chefe interino da revolta dentro de um par de horas.
À hora anunciada, um general promovido, enfiado numa fatiota dois números acima, apareceu à frente da televisão. Desembrulhou um papel amarrotado, extraído ao sufoco do bolso junto à lapela. Não conseguia esconder o enervamento. Tossicou duas vezes, prolongando a ansiedade dos espetadores. A voz começou a sair trémula:
Bom povo, esta é a vossa carta de alforria. Os bastardos agiotas já não nos apoquentam mais. Os cabecilhas do grupo estão sob detenção. A junta revolucionária decidirá, em harmonia com a vossa vontade, a punição de que são merecedores.
Os negociadores sentiram um aperto na goela. A boca secou-se. Os batimentos cardíacos acelerados, como se o coração quisesse saltar as peias onde estava acantonado. Começaram a temer pela sorte. Sabiam, a história recordava-o, nos tumultos revolucionários a lucidez ausenta-se dos palcos. Temiam pela selvajaria. Que a turba enfurecida, com sede de vingança, arrombasse as portas das celas e acertasse as contas da vingança pelas próprias mãos. Os olhos cansados voltaram a fitar a televisão. O general deslavado continuava a ler o manifesto, já sem a voz trémula. Aflito, quase na tangência da apoplexia, um dos negociadores ainda reteve o catecismo que encerrou o manifesto lido pelo revoltoso:
Agora dirijo-me aos povos da Europa. Não capitulem. Os agiotas não nos podem derrotar sob os escombros do capital parasita. Somos humanos, somos dignos. Aprendam com a nossa lição. Somos outra vez a vanguarda da civilização. De uma nova civilização. Amotinem-se. E convençam-se que a Europa é nossa.

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