11.11.11

O homem que comia comunistas ao pequeno-almoço


In http://www.ruadireita.com/info/img/o-dialecto-dos-talheres.jpg
Se calhar é por hoje calhar um dia de tripla capicua (é onze no dia, no mês e no ano) – com elevada probabilidade de assombrosas exegeses cabalísticas  virem à superfície. O mito urbano de outrora, um das catacumbas salazaristas, era um embuste. Afinal os comunistas não comem criancinhas ao pequeno-almoço. A antropofagia está algures: o boçal e esquizofrénico homem da banca dos jornais, que faz uma perninha no táxi ao anoitecer, (veio a saber-se agora) entretinha-se a comer camaradas que perseguia desde que saíam das instalações locais do partido comunista.
O homem boçal tinha pinta de psicopata (pode-se dizê-lo agora que os prognósticos a posteriori são validados). Os olhos encovados, o rosto sorumbático, a antipatia genética, a pele macilenta e as mãos pesadas, a dentição cheia de falhas e de carência de tratamento, as roupas folclóricas e a aparência desajeitada, os monossílabos com que respondia a quem lhe aparecia como cliente: eram estes os sinais de uma patologia iminente.
Sabe-se agora, o homem era doente por comunistas. Não o fazia por especial gosto (disse às autoridades que já experimentara não comunistas e que eram mais saborosos). Especializara-se na caça a comunistas e, em sua defesa, jurou que eram carne mais dura e acidulada. Desparafusado pela demência, berrou com indignação: “sou credor da república. Faço um sacrifício por ela. Estes comunas são quase intragáveis. Com os meus préstimos, vou livrando a sociedade da peste vermelha.
Os polícias que o interrogavam na esquadra estavam atónitos. Chamaram um psicólogo e um psiquiatra, tinham de ser acolitados por peritos que decifrassem a demência. Um deles ensaiou uma explicação da normalidade. Disse-lhe que os comunistas locais não vinham acusados de crime algum. O homem, cego pela demência, cuspiu com ferocidade: “o presidente deve-me condecoração no 10 de junho. Telefonem-lhe para que vos ordene que me soltem.
Na cadeia, todos se impressionavam com a destreza do homem boçal. As paredes da cela estavam cheias de bustos de eminentes comunistas (vivos ou já desaparecidos). Em todos, a forca à volta do pescoço. Era a sua peculiar maneira de imaginar que continuava a comer comunistas.

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