6.6.07

Eu não sou do CDS não sou do CDS não sou do CDS não sou do CDS não sou do CDS


Palavra de honra que pouco me importo com as ideias que os outros têm de mim. Só fico perplexo quando me colam rótulos, ou me aconchegam a sectores, nos quais não me identifico nem um pouco. Há dias soube que sou visto como próximo do CDS (ou do PP, ou do CDS-PP, ou lá o que isso seja). Numa resposta a um comentário num blogue de um amigo, tomei conhecimento da “(…) proximidade que amiudadas vezes (me) fazem com o CDS.

Há quem se deixe levar pela tentação da rotulagem fácil. Tira-se a pinta, ouve-se umas palavras esparsas e está produzido o retrato estereotipado. E depois há sempre o devaneio das conotações forçadas. Se não somos disto ou daquilo ou daqueloutro, então somos necessariamente daquele que não se revê nos anteriores. Ora há dissidências desta forma de estar. E há quem não se reveja em nenhum dos actores principais que desfilam em cena, ou sequer gravite nas suas imediações. Decifrando: causam-me espécie todas as esquerdas; tenho o PSD como um partido de centro-esquerda; mas não, isso não me conota com o CDS.

Aliás, o CDS (em todas as suas variedades sazonais – de CDS-PP a PP ou apenas CDS) é um moribundo que me provoca abundante riso. Há ali o que de pior encerra a direita lusitana. Um misto de catolicismo de sacristia, conservadorismo bacoco, empedernido intervencionismo do Estado, uns laivos de autoritarismo que descerram algum saudosismo do passado enterrado com a revolução de 1974. São adeptos das touradas, feitores do marialvismo anacrónico, ainda penhores de uma visão retrógrada da sociedade. Tudo isto me coloca nos seus antípodas.

Ora não compreendo como me situam no limiar deste partido. Porventura por andar frequentemente de fato e gravata. Porventura por até ter um fato azul às riscas, como o líder Portas gosta de envergar. Ou pelas gravatas. E um pouco pela urticária que as esquerdas me provocam. Ou por tudo isto junto. Mas não valem mais as ideias do que os ares a que nos damos? Mal de nós se fosse vedado um adereço (o fato e a gravata) só porque está convencionado que se os usarmos lá vem a colagem a uma determinada pessoa ou a uma determinada facção. Curiosamente, também visto t-shirts pretas. O que me faz transitar de uma extremidade à outra, pois a esquerda caviar está habituada a envergar esse tipo de vestuário. Serei à semana do CDS e ao fim-de-semana do Bloco de Esquerda?

Outro exemplo de como os estereótipos são um perigoso alçapão para quem os edifica: a música que ouço é pouco conhecida dos circuitos comerciais – a dita “música alternativa”, para quem gostar de engavetar estilos. A direita beata e beta do CDS não ouve esta música. Por este prisma, estou no oposto da direita trauliteira. Acrescento outro ingrediente de desidentificação: nas raras vezes que saio à noite, na listagem de locais preferidos figuram alguns bares do roteiro underground, que têm uma fauna onde nidificam adeptos da extrema-esquerda. Não me incomoda. Não frequento esses locais pelas pessoas que lá estacionam. Nem para ser visto, ou com receio de, lá sendo visto, arrostar com o rótulo de “esquerda caviar” (ou extrema-esquerda, sinónimo).

Talvez o erro de análise esteja no hábito de colocar as pessoas dentro de categorias herméticas. Temos que pertencer a algo, ou pelo menos estar nas suas franjas. Revejo agora a provocação: “(…) a proximidade que amiudadas vezes (me) fazem com o CDS.” Trata-se de proximidade, não de militância ou sequer de simpatia. Lá está, a proximidade que remete para as cercanias de um sector. Devo dizê-lo: não há a mínima proximidade. A mínima identificação. Aliás, quando vejo e escuto destacados militantes deste partido a falar, apetece-me ir a correr para os braços da esquerda caviar. (Sossego-me logo de seguida: imaginar-me nos braços da esquerda caviar é um pesadelo oportunista.)

Seria mais acertado acusar-me de ser de direita. Ainda que a acusação encerrasse alguma falta de rigor: da mesma forma que tenho o cuidado de referir “as esquerdas” – porque elas são um arco plural, basta ver como se desentendem com uma espectacularidade autofágica – também há “direitas”. Se há assim tanta urgência em pôr-me num cabide qualquer, que seja na direita – desde que essa direita não seja a direita trauliteira, nacionalista, conservadora, tresandando ao catolicismo bafiento, ambígua na defesa da iniciativa privada mas logo de seguida de mão estendida à generosidade dos negócios com o Estado, a direita que apregoa a moral e os bons costumes. Será tão provável figurar nas adjacências do CDS (ou do PP ou do CDS-PP, ou noutro alter-ego que ainda venha a ser inventado, nesta esquizofrénica deriva de personalidade) como ir a um concerto de David Fonseca, ou comer enguias, ou considerar Mário Soares um herói com pertença no panteão nacional quando fenecer.

Mantenho a teimosia de dizer o seguinte: não sou de esquerda nem direita. Antes pelo contrário.

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