8.7.05

Terrorismo, hipocrisia

A angústia macerava-se na boca dos londrinos, à espera do inevitável. A ameaça vinha de longe, fermentando no espírito ignóbil dos terroristas carrascos de inocentes. É este o âmago da questão: a chacina de inocentes, no inditoso destino de serem nacionais de um país cujo governo entrou em aventuras bélicas, ou pessoas que não tendo essa nacionalidade tiveram a infelicidade de serem visitantes do local no dia errado.

Tenho um certo fascínio pela civilização árabe. Dado ao multiculturalismo, não subscrevo teorias que objectivam comportamentos e padrões civilizacionais. Este local já serviu para renegar as visões etnocêntricas do mundo. São o combustível que inflama um choque de civilizações cuja nitidez se faz notar com a passagem do tempo. Também não fui adepto da última intervenção militar no Iraque, nem da fórmula escolhida para pacificar a região após a deposição do sanguinário ditador. Nada disto me leva a compreender os actos de terrorismo que a rede Al-Qaeda espalha pelo mundo.

Os que esboçam teorias que levam à compreensão do fenómeno terrorista, tentando analisá-lo na óptica de quem perpetra os actos de terror, alegam que este é o único meio à disposição do beligerante mais fraco devido à desproporção de forças. Um terrorismo que prolifera na incerteza do local que será atacado, na incerteza do momento em que as bombas serão detonadas. Uma chaga sem rosto, um inimigo invisível que só se detecta depois da devastação ter chegado sem aviso. É óbvio que existe uma gritante desproporção de meios entre os grupos terroristas árabes e os exércitos das potências ocidentais que os combatem. Não será esta desproporção que justifica os meios utilizados pelos terroristas.

A frieza, a brutalidade praticada, o sangue de vítimas inocentes derramado, nada legitima os actos cometidos nem embeleza a causa dos fundamentalistas árabes. Dir-se-á que pouco lhes importa a avaliação feita deste lado, mesmo por aqueles que mostrem uma certa compreensão pela causa que defendem. Vivem num mundo diferente, presos a quadros mentais ininteligíveis para os leigos do ocidente. É como se um abismo profundo nos dividisse. Nesse abismo cultiva-se uma intolerância de parte a parte. À intolerância que se exibe no fragor das bombas que guilhotinam inocentes apanhados pelo caminho, a resposta vem na intolerância que goteja em reacção às horrendas imagens da destruição semeada pelos terroristas. O abismo vai-se adensando, numa caminhada para o caos que se desconhece.

Mesmo com as cautelas de quem evita cair no alçapão do etnocentrismo, não aceito os métodos hipócritas dos terroristas que atacam inocentes. Eles dirão que as pessoas que vitimam não são inocentes, porque são cidadãos de um país que é, como um todo, o inimigo a abater. Tomam a árvore pela floresta, arriscam-se a fazer tombar sem vida pessoas que não se revêem nas decisões bélicas do seu governo; a matar turistas que estejam no gozo de um merecido descanso na cidade errada, no dia errado; até a ceifar a vida de irmãos da fé islâmica, que tantos há por Londres, tantos frequentam os transportes públicos para irem trabalhar.

Nada disso interessa aos fundamentalistas árabes que covardemente se escondem na face anónima dos cegos ataques terroristas. São vítimas colaterais, mas vítimas que destilam a absurda cegueira da causa que prosseguem, misturada com os traiçoeiros métodos em que são peritos. Adivinho que questões de imagem não são prioridade para estes grupos terroristas: não estão preocupados em captar simpatias entre o mundo ocidental. Por isso se esmeram nos métodos carniceiros, primitivos, desumanizados. Perdendo razão na causa por que dizem lutar.

O método de atingir inocentes não é exclusivo dos fundamentalistas árabes. Há dias passaram imagens de uma das inúmeras manifestações de activistas anti-globalização, onde o folclore se mistura com violência. Vi os manifestantes avançarem em direcção da polícia, arremessando tudo o que estava à mão, obrigando os polícias a um recuo táctico – não fossem investir com bastões e canhões de água, para depois serem acusados de “violência policial”. Vi um encapuçado adepto do anti-capitalismo a partir o vidro lateral de um anónimo automóvel que, para infelicidade do proprietário, estava parqueado no local errado. Já nem pergunto pelo respeito pela propriedade alheia, coisa desvalorizada pelos grupelhos que cirandam em redor destas folclóricas manifestações. E se, por acaso, o proprietário daquele veículo tivesse alguma simpatia pelas ideias dos movimentos anti-globalização, onde está a justeza do acto violento praticado pelo animal?

Em ambos os casos – ataques terroristas em Londres e violência indiscriminada que leva tudo à frente nas manifestações anti-globalização – uma irmandade nos métodos utilizados. As consequências são diferentes – menos graves no segundo caso, por não tolherem vidas. Mas nada os separa nos métodos.

5 comentários:

Anónimo disse...

Análise simplista e primáriamente comparativa.
Colocares os dois fenómenos ( terrorismo e manfestações anti globalização) no mesmo prato é algo de básico e populista;
Não vou argumentar o que já argumentei mas apenas te digo nem o Bush dava uma calinada dessas e demonstra que ainda estás pouco aberto ao mundo; mas isso não de dá o direito de metralhares pensando que com essa acção fazes algo de concreto e positivo.
Fazer uma análise minuciosa dos dois fenómenos, isso sim será bom para quem te lê e não tem a informação toda.
Sofro também com o terrorismo, sofro também com os biliões de pessoas que não têm para comer.
Bom dia para ti

PVM disse...

A cada um a sua falta de inteligência - ou a incapacidade hermenêutica. Eu só respondo pela minha...

Paulo Vila Maior

Luís Norberto Lourenço disse...

Subscrevo o artigo.
O terrorismo e o vândalismo, consequência ritualizada de algumas manifestações, só leva a que todos paguem pelos graves erros e crimes de alguns. Pagam com a vida as suas vitimas, pagamos todos depois com o apertar da segurança.
É o dilema: liberdade/segurança.
O Hamas parece ter descoberto as delícias do voto... o voto como arma, estando a pensar em deixar a via armada, que outros façam o mesmo.

Luís Norberto Lourenço

PVM disse...

Um tema interessante, o binómio liberdade/segurança. Com a onda securitária que nos varre, estarão as liberdades individuais a capitular perante o terror que não respeita a vida humana? Será a fobia securitária um simples expediente para reforçar a autoridade das autoridades, esbatendo a fronteira entre a liberdade individual e a necessidade de que alguém nos garanta a segurança? Para os que desconfiam da intrusão do Estado, os movimentos terroristas acabam por ser preciosos aliados de um Estado que se renova com as limitações às liberdades em nome da segurança. Que estranhas alianças se descobrem por entre um manto espesso de nevoeiro…

Paulo Vila Maior

Anónimo disse...

Eu gostava de saber quem é ou não fundamentalista no mundo árabe. No meu entender são a esmagadora maioria dos muçulamanos, que não se coibem em expressar pelo voto (Irão)a seu esmero pelo fundamentalismo. Criticas à Al-quada ou a Bin Laden nem vê-las.
Depois a culpa é do RU e dos EUA, pelo Iraque, como se o terrorismo tivesse começado depois da guerra. O Blair e o Bush é que são Homens porque tiveram a coragem de atacar a besta. Ao contrário dos fundamentalistas que aquando da invasão (a mais fácil da história militar) não tiveram coragem para fazer façe às forças da coligação e agora mostram o que valem ao fazerem ataques terroristas contra inocentes.
Os islâmicos odeiam-nos e mais nada. Querem que o ocidente se torne uma civilização atrasada, medieval e teológica como a deles. Eu prefiro morrer num ataque terrorista a viver sob a égide do Corão. Eles que aprendam é a viver sem o Corão; e vão ver como a vida é muito melhor sem obedecer a um livro escrito para pastores nómadas.
Eles que fiquem com o seu corão que nós ficamos com o nível de vida, a pluralidade, o civismo, o futebol, a música, as novas tecnologias, as comunicações, a liberdade de pensamento, a igualdade entre sexos, a inovação, as universidades (não teológicas), ect.
Esses fracassados gozem bem o corão, mas longe do mundo civilizado. Eu tenho muito gozo em ver como eles vivem a única vida que têm.

PS: não tenho nada contra quem morra pela religião. Até acho que todos os fundamentalistas, se quiserem, devem morrer pelo Corão, para alcançar o céu deles. Não matem é trabalhadores e estudantes do mundo civilizado. Suicidem-se sozinhos. Ninguem chorará por vós.